30/05/2012

VISÕES E PREVISÕES

O povo fala...
O povo diz...
O povo pergunta
para onde vai este país...?

Ms o país parado
permanece calado
entre nuvens negras
e lixo amontoado!

Entretanto, os figurões
os barões, e os tubarões...
Vão tendo visões
e fazendo previsões...!

Eles falam de esperança
como se ainda houvesse esperança...

Eles falam de futuro
como se fosse possível haver futuro...

Não sei com que olhos é que eles vêem
aquilo que eu não consigo...
Mas deverá ser com um olho
que eu agora aqui não digo...!

José Gago

COMO EU GOSTAVA

Meu Deus!
Como eu gostava de ser pintor!
Ter a arte e o traço
de um Dali, ou de um Picasso
e poder pintar o mundo de outra cor!

Ai, se eu tivesse o privilégio
ou sortilégio
de pintar o sonho que me sustenta...
Certamente, que esta vida, não seria tão cinzenta!

Nem que fosse necessário roubar as cores do Arco-Ìris
eu haveria de levar por diante esta minha vontade...
E pintaria o negro deste mundo
bem da cor da felicidade!

José Gago

ENCANTADOR DE SERPENTES

Para quê, fazeres-me acreditar num caminho de rosas
se há um espinho que se crava nos meus pés
em cada passo que dou...?

Para quê, prometeres-me uma seara de trigo loiro
se tudo o que lanças à terra
são sementes contaminadas pela hipocrisia...?

Para quê, anunciares um céu azul
se apenas sabes pintar nuvens cor de breu...?

Por favor! Pára de fantasiar!
Tu não estás numa pista circence...
E nenhum dos teus truques, já me convence!

Desiste!
Não pretendas ser um encantador de serpentes...
E cala-te
porque quanto mais falas, mais mentes!

José Gago

29/05/2012

UM GIRASSOL VERMELHO

Eu não folgaria em ser uma rosa
nem um lírio...
Tão pouco um malmequer...

Não gostaria de ser jasmim, ou alecrim
nem outra flor qualquer
que enraizasse dentro de mim...!

Eu gostaria sim, de ser um girassol...
Grande e lindo como o sol...!

Um girassol gigante,
brilhante como um espelho...
E que em vez de amarelo
fosse vermelho...!

Vermelho de vitória!
vermelho de alegria!
Que tivesse folhas de amor
e pétalas de magia...
Que as suas sementes voassem
e germinassem aos milhões, em cada dia!

Pudesse eu ser essa flor rara
de tão sublime simplicidade
e faria deste mundo uma seara
vermelha de Liberdade!

José Gago

É DEMAIS...

Sintonizo a rádio
folheio os jornais
e vejo os telejornais...
E todos os dias
as noticias são sempre iguais!

São os arraiais
das campanhas eleitorais...

São as politicas iguais
dos partidos principais...

São as reformas estatais
e as trapalhadas governamentais...

São as negociatas tradicionais
dos corruptos imorais...

São os escândalos habituais
das figuras ministeriais...

São as fugas de capitais
para os paraísos fiscais...

São as reformas brutais
duns certos fulanos tais...

São os roubos tradicionais
das derrapagens orçamentais...

São as falcatruas monumentais
que nunca chegam aos tribunais...

São os processos judiciais
que mais parecem carnavais...

São as leis especiais
que protejem os marginas...

São os impostos brutais
e os cortes salariais...

São os golpes fatais
nos direitos sociais...

São as fortunas colossais
a engordar, cada vez mais...

E é um povo aos ais
a ser devorado pelos chacais!

E perante tantas coisas anormais
só nos apetece gritar...
Chiça! Que é demais!

José Gago

28/05/2012

OS FRACOS

Caso aceites ser um caco
sem ambição de vitória
serás toda a vida um fraco...
E dos fracos, não reza a história!

Podes ser homem de bem
no seio do mundo opaco
mas nunca serás ninguém
caso aceites ser um caco!

Se não tentares abrir a porta
do sucesso e da glória
não passas da cepa torta
sem ambição de vitória...

Se o viver não for risonho
a vida torna-se um saco...
Se não agarras o sonho
serás toda a vida um fraco!

Ser fraco, é ser esquecido
na lixeira da memória...
Porque um fraco,é um vencido
dos fracos não reza a história!

José Gago

SONHO AZUL

Desperto dos meus sonhos e pesadelos,
em plena Serra do Louro, tesouro
com quem partilho o silêncio da noite...

Esfrego os olhos, embriagados de luz
e faço uma vénia ao velho moinho
meu pergaminho...
Convidando o sol, a entrar devagarinho...!

Com um pequenino salto
chego ao Castelo, belo e altaneiro
de onde posso abraçar o mundo inteiro!

Estendo então, o meu olhar feliz
ao Vale dos Barris...
E atiro um sorriso à Serra de S.Luis!
De seguida, abraço a Quinta do Anjo
cumprimento a Lagoinha
e dou uma piscadela de olho, maliciosa
à Vila de Pinhal Novo
a nossa linda vizinha...!

Olhando mais além, descortina-se o Lau...
Lagameças...
Marateca, Poceirão...
Tudo cepas do bom vinho
e fornos do bom pão...
Onde o ar sabe a moscatel e a queijo de Azeitão!

Sigo depois a minha viagem ocular rumo ao sul
e o que vejo deixa-me aturdido...
Estarrecido!
Cego de tanto azul...!

Vejo o Sado a espreguiçar-se, vaidoso
voluptuoso...
E pergunto a Deus, porque é que deu
tanta beleza
Aquele rio da cor do céu...!

Tudo em meu redor é altivez, embriaguês
um sonho azul de mar e serra...
Lá no alto, o sol aquece
e até parece, que o próprio sol
não é tão lindo, como a minha terra...!

José Gago

25/05/2012

SOU DE OUTRO MUNDO

Por favor, oiçam-me!
Eu não pertenço ao vosso mundo...
Eu sou um caminheiro em viagem
e estou aqui, apenas de passagem!

Eu sou de outro mundo!
Um mundo diferente
com outra gente...

Eu pertenço a um mundo honesto
civilizado...
Onde não estou só, nem mal acompanhado!

Onde não existem propagandistas do discurso fatela,
nem moralistas de meia tigela!

Sem parasitas criminosos
nem políticos hipocritas, vaidosos e mentirosos!

Eu sou de outro mundo!
Feito de verdade e fraternidade...
Onde se cultiva o respeito e a dignidade!

Eu não pertenço, nem quero pertencer
ao vosso pãntano lodoso, mal cheiroso,
do desprezo e do desdém...

Porque o meu mundo, é meu!
Vivo lá eu e mais ninguém...!

José Gago

APENAS UMA PEDRA

Tal como uma pedra
que se tivesse desprendido de um penhasco
e rolasse vertiginosamente encosta abaixo...
Assim tu te desprendeste, do alto da tua vaidade...

Rolaste pela encosta da vida
e hoje permaneces imobilizada,
bem no fundo da ravina...

Que importa agora, que tenhas sido
um mármore bonito, e bem polido...?

Que importa agora, que tenhas sido um pedestal
num qualquer palácio real...?

Que importa agora, os pés que te pisaram,
ou as mãos que te afagaram...?

Que importa agora, o verniz afamado
que deu brilho ao teu passado...?

Quebrada, prostrada
sem brilho nem graça...
És apenas uma pedra
aos olhos de quem passa...!

José Gago

AMANHÃ, MEU AMOR!

Amanhã, meu amor!
Se a tarde estiver amena, sem vento nem frio...
Vou convidar-te, para um passeio
no jardim junto do rio
onde há tantos anos, o nosso amor floriu...!

Sentados os dois,
num daqueles bancos entre os arbustos
eu abraçado a ti, e tu abraçada a mim...
Vamos recordar um pouco da nossa história de amor
passada nesse jardim...!

Depois, caminharemos ambos
até ao velho freixo junto da ponte,
à sombra do qual
nós trocámos um dia o nosso primeiro beijo...!
E foi também aí, que eu recitei para ti
aquele poemazinho meio pateta...
Que eu escrevi para ti
quando o teu amor, me inspirou a ser poeta!

Chamava-se "Menina dos olhos tristes"
E ainda me lembro dos primeiros versos...
..................
Menina dos olhos tristes
manda essa tristeza embora
anda cá para os meus braços
que eu quero beijar-te agora...

Eu quero beijar-te agora
quero sentir teu calor
menina dos olhos tristes
quero ser o teu amor!
......................
Amanhã, meu amor!
Voltaremos a debruçar- nos, no varandim da velha ponte
fazendo reflectir a nossa imagem na água
de rosto colado, como fazia-mos no passado...
E quem sabe?
Ainda veremos por lá, o nosso peixinho encarnado...

Amanhã, meu amor!
Quero caminhar contigo de mão dada...
Quero ver-te rir
quando eu disser uma piada...
Quero dizer-te, obrigado!
Por me teres aturado, a vida inteira...
E por fim, atrevido, segredar ao teu ouvido
que te amo, da mesma maneira!

Amanhã, meu amor!
Quando a noite escurecer...
Felizes, vamos dizer:
Que bom! Recordar é viver...!

José Gago

23/05/2012

A VELHICE

Ser novo e ter saúde,
é a suprema virtude
que na vida nos é dada...
Mas quando chega a velhice
o viver vira chatice
e a vida não sabe a nada...!

Para o novo, o sonho impera
todo o ano é Primavera
não há dores, nem desalento...
Para o velho é sempre Inverno,
os dias tornam-se Inferno
e as noites são um tormento!

Como uma onda em crescendo
os males vão aparecendo,
vão-se o ânimo e a alegria...
Vão-se o desejo e a rigidez,
faz-se agora de mês a mês
o que era feito dia a dia...

Vem o colesterol, sobe a tensão
vêm os zumbidos e a má circulação
as cataratas e o reumatismo...
Vêm os diabetes e as tonturas
as alergias e as tremuras
a angústia e o abismo...!

No Outono de uma vida
o sol passa de fugida
não há esperança, nem pachorra...
Sem ter como nem porquê
por mais voltas que se dê
chegar a velho, é uma porra!

José Gago

OS MUROS DA VERGONHA

E de repente, o muro caíu!
A vergonha ruiu...
O mundo aplaudiu...
A Liberdade, sorriu!

E no entanto...
Outros muros existem!
Outras vergonhas persistem!
Currais
limitadores de ideais...
Porque os muros
são todos iguais!

Não existem muros
que personifiquem dignidade!
Não existem muros
que dignifiquem a humanidade!

Abaixo os muros!
Viva a Liberdade!

José Gago

JANELA DO PASSADO

Hoje acordei sentimental!

Lágrima ao canto do olho...
Uma nuvem na alma...
E um soluço debruçado
á janela do passado...!

Não sei se terá sido sonho
ou pesadelo...
Não sei se foram horas, ou minutos...
Só sei que acordei agitado
embrenhado, no mundo mágico da minha infância...
Como se eu tivesse voltado
a esse mundo doirado
diluído, na memória da distância...!

Lembro-me de ter voltado a respirar
o verde-vivo dos trigais...
De ouvir de novo a voz do vento
na ramagem dos pinhais...
E, Meu Deus!
Como eu corri pelos campos
livre, como os pardais...!

De desvario, em desvario
e em rodopio...
Andei por todos os cantos e recantos
que foram outrora
bastiões dos meus encantos!

As adegas, os celeiros...
As hortas, os moinhos altaneiros...
E claro! A minha velha escola!
Essa casa grande e fria
onde aprendi a ler e escrever...
e de tantas recordações
que jamais posso esquecer...!

E lá estavam, o Chico e a Rosa...
O João Sapateiro e a Mariana...
O Serôdio e a Soledade...
E tantos outros
da minha saudade...!

E como poderia eu esquecer-me
da minha professora Adelaide...?
Quando ela nos gritava com a sua voz de trovão...
Meninos, muita atenção!
O Estado Novo - é o tema da redacção!

Não sei se terá sido sonho
ou pesadelo...
Não sei se foram horas, ou minutos...
Só sei que acordei sobressaltado, esquisito...
com uma voz a chamar-me:
Ó ZÉZITOOOOO...
Era a voz de minha mãe!
Impossivel, não reconhecer aquele grito!

Hoje acordei sentimental!

Lágrima ao canto do olho...
Uma nuvem na alma...
E um soluço debruçado
à janela do passado...!

José Gago

UM ARCO-ÌRIS CINZENTO

Olho para o campo triste, e ressequido
despido, de flores e erva verde...
Nem um lírio!
Nem uma papoila!
apenas cardos,  a morrer à sede...!

Entretanto, a bruma que se adensa em meu redor
impede que eu vislumbre
a tal luzinha, ao fundo do túnel...
Pois tudo o que os meus olhos alcançam
é um pedaço de céu, totalmente, vazio de estrelas...!

Sobrevoando a campina
somente os abutres
e outras aves de rapina!

Pergunto ao vento, onde estão as pombas brancas!
Onde pára a cegonha...
O cartaxo, a cotovia...
Mas o vento afasta-se, triste
silencioso
espalhando a melancolia...!

E enquanto o vento emudece, e não responde...
um arco-íris, cinzento
que leva o doirado do sol, não sei para onde...!

José Gago

22/05/2012

A TUA MADRUGADA

Foi há muito tempo, eu sei!
Mas eu recordo
como se tivesse sido hoje!

Como se tivesse sido ontem...
Em qualquer outro dia...
Em qualquer outra madrugada...
Tal a avidez com que eu bebi
o mel da tua chegada!

E tu chegaste assim
de mansinho, sem ninguém te esperar...

Trazias vestida uma farda de ilusão
e na mão, uma espingarda de luar...
Com um cravo no cano
pronta a disparar!

Trazias os olhos rasgados,
pintados com as cores da utopia...
Trazias no peito
o clarão dum novo dia...
E nos lábios
os versos de uma nova poesia!

Tudo em ti era novo!
Até a maneira como pronunciavas
a nova palavra povo!

Povo que te cantou
e gritou o teu nome, até à exaustão...
Que desfraldou bandeiras proibidas
e abriu as portas da prisão...
E no fim te guardou
para sempre em seu coração!

Foi há muito tempo, eu sei!
Mas é no tempo que o teu nome perdurará...
E mesmo na memória mais cansada
a tua linda madrugada
ninguém mais esquecerá!

José Gago

SAFIRA

Não te conheço!
Nunca te vi, nem sei o teu nome
mas sei que existes!

Imagino-te
linda como o sol...
E cândida como uma flor
com pétalas de amor!

Sonho-te, cintilante
tal uma pedra preciosa...
Por isso te chamo Safira
jóia, botão de rosa!

Se um dia eu te encontrar
em qualquer lugar
onde não haja vento, nem escuridão...

Espero poder beijar-te
e depois guardar-te
em meu coração!

José Gago

TENHO PENA

Nunca perdi
nem quero perder o meu tempo
a lembrar o que se passou...
Nem chafurdar
no motivo que nos separou...!

Também não me preocupo
nem nunca me preocupei
em saber
se foste tu que erraste
ou se fui eu que errei...

Digo-te somente, que tenho pena!
Pena que as nossas vidas
tenham sido assim atiradas ao fundo...
Implicando que o nosso possível reencontro
tenha lugar, talvez só no outro mundo!

Tenho pena por mim e por ti...
por tudo o que se passou
e não se passou...
Mas tu és como és
e eu, sou como sou!

Resta-me a consolação do meu sangue correndo em ti
e a certeza de amar-te
e nunca odiar-te!

José Gago

UM RESTO DO TEMPO

É um facto indesmentível,
que o meu aparecimento neste mundo
se deveu a um acidente do acaso...

Por descuido dos meus pais
eu fui uma espécie de encomenda
entregue fora de prazo!

E talvez por ter nascido assim, fora de tempo,
sou levado a pensar
que eu no fim não serei mais
do que um resto do próprio tempo!

Sinto que sou assim
como um resto de mosto espremido
caído do lagar
sem ninguém esperar...
Uma semente meio apodrecida
que na terra, perdida
acabou por germinar...!

E é por causa deste pensamento
que há muito me abraçou
que eu me acho um resto do tempo...
Dum tempo que já passou!

José Gago

O ZÉ - PÉ DESCALÇO

Com praias nos neurónios
e sereias no olhar...
O Zé - pé descalço de Portugal
sente-se um pardal pronto a voar...

Vai de férias!
Todo ele é presunção...
Ar de turista...
Entra no avião
e diz umas lérias
com ar fanfarrão
dum galo sem crista...!

Com poucas maneiras
cospe baboseiras...
Deixa as dívidas
leva as peneiras...
E muitas misérias
nas algibeiras!

Óculos espelhados
camisa de ramagem...
Ele está eufórico
metiórico...
Sente-se, o Rei daquela viagem!

E o Zé lá vai!
Vai para o México...
Vai para Cuba...
Brasil, Republica Dominicana...
O Zé é rico
por uma semana!
.................
Uma semana...
Depressa passou!

O Zé regressou
as férias findaram...
As dívidas aumentaram
e o Zé constatou
que tudo piorou!

Ele começa a somar
e nem quer acreditar
no que tem para pagar...

A renda da casa, o carro,
o computador, a televisão...
A escola dos filhos
o peixe, a carne e o pão...
A água, a luz e o gás
mais tudo o que vinha de trás...
Meu Deus!

E o Zé parou!
Pensou...
E chegou à seguinte conclusão:
Deixa p'ra lá!
O melhor é não stressar
e começar a pensar
nas férias do próximo verão...!

Afinal, a vida são dois dias
e o viajar sabe tão bem...
Quanto à vergonha
é só p'ra quem a tem...!

José Gago

21/05/2012

O CASINO

Que a gente queira, ou não queira
este mundo é um casino
onde passamos a vida inteira
a jogar nosso destino...

À volta da grande roda
todos os trunfos são jogados
só que uns, rapam a massa toda
e outros, ficam depenados...

Há quem vá a jogo sem nada
mas em hora tão oportuna
que a sorte, nessa jogada
lhe abre a porta da fortuna...

Também há quem jogue forte
apenas por presunção
e ao brincarem com a sorte
perdem com o jogo na mão...

Nem sempre se compreende
esta roleta azarada
mas ás vezes tudo depende
duma boa, ou má jogada...

Quanto a mim, estou conformado
já nem me iludo com truques
porque o jogo está viciado
e a mim, só me sai duques...!

José Gago

UM PAPO COM A SAUDADE

Já o sol se está escondendo
e a pouco e pouco a cidade
veste o negro a que eu me ligo
Já vejo a noite descendo
logo mais, vem a saudade
bater um papo comigo...

Com o cunho que a denota
vem discreta e sem temor
matar o tempo a meu lado
Entre um copo e uma anedota
falamos coisas de amor
e até cantamos o fado...

Mas se por casualidade
eu lhe falar do outrora
quando contigo vivi
No mesmo instante a saudade
levanta-se e vai-se embora
por não querer falar de ti...!

José Gago

A MINHA QUARTA CLASSE

Eu sei que, como instrução
a minha quarta classe
será demasiado insignificante...
Porém, e ao longo da vida
ela sempre se revelou, para mim
um requisito, deveras importante...!

È inegável, que sinto pena de não ter ido mais alem
como era o desejo de minha mãe...
Mas assim, com a minha quarta classe
também me sinto bem...!
Porque dentro da sua simplicidade
ela tem sido a minha companheira de toda a vida
e tem praticamente, a minha idade...

Eu amo a minha quarta classe!

Ela esteve na minha adolescência
na minha juventude...
No serviço militar
na guerra do ultramar...
Sempre me ajudou a trabalhar
e nunca, nunca
deixou de me acompanhar...!

Com certeza, que em muitas ocasiões
e como é natural
senti pena de não poder ser um intelectual...
Mas a verdade, é que a minha quarta classe
nunca me deixou ficar mal...!

Com ela, estive no fado
ajudou-me a ser fadista...
Com ela, escrevi canções
marchas populares, quadros de revista...
E com a minha quarta classe
quase me tornei um artista...!

Até que um dia
quando se abriram em mim, as portas da poesia...
Foi mais uma vez a minha quarta classe
que me ajudou a mostrar ao mundo
o pouco que eu sabia...!

E assim, lado a lado
rasgando as brumas do tempo...
Eu e a minha quarta classe, de braço dado
vamos cumprindo o nosso fado, ao sabor do vento...!

José Gago


16/05/2012

JANELA SEM CORTINA

Frente à minha janela sem cortina
passa gente
ausente...
Vestida de silêncio!

Gente que se move como sombras!
Silhuetas sem rosto
em desatino...
Que caminham na bruma
sem vontade, nem destino...!

São corpos moribundos
mentes em declínio
tropeçando a cada passo...
São desejos ardidos
olhos perdidos
no tempo e no espaço...!

Ninguém olha...
Ninguém vê...
Ninguém fala...
Ninguém canta...
Ninguém sonha...

Frente à minha janela sem cortina
passa gente
ausente...
Vestida de silêncio!

José Gago

CONFLITO

Porque passaram a ser demais
o confronto e o desentendimento
já não posso esconder mais
o meu conflito com o tempo!

Conflito, que na verdade,
entre nós já é antigo...
Só que na actualidade
o tempo na realidade
entrou em guerra comigo!

Confesso que noutro tempo
quando eu era rapagão...
Eu nunca liguei ao tempo
nunca lhe passei cartão...

Mas agora que gosto dele
e até lhe quero bem...
É o tempo que me despreza
como se eu fosse ninguém!

Trata-me de forma cruel
como se eu fosse um papel
atirado p'rá lixeira...
Um bibelot rejeitado,
inútil, abandonado,
esquecido na prateleira!

Mas o tempo é mesmo assim
vingativo e prepotente...
Está a vingar-se de mim
como faz com toda a gente...!

José Gago

MESMO ASSIM...

Não sou,
nem nunca fui muito dado
a essa teoria,
de que se nasce com o destino marcado...

Como se o destino fosse culpado
de eu ter sido toda a vida
um burro, acomodado!

Comodismo!
Foi esse o único defeito
que me impediu
de ser alguém de jeito...

Mesmo assim...
Sem grandes alardes, nem glórias
ainda consegui algumas vitórias...!

Consegui sempre trilhar
o caminho da honradez e da verticalidade...
Sem hipotecar nunca
a minha independência, nem a dignidade...!

Consegui estar sempre do lado oposto
da calúnia, e da injustiça...
E separar-me da hipocrisia, ou da amizade postiça!

Consegui por fim
através da minha poesia
dizer ao mundo muitas coisas
que de outra forma, nunca as diria...!

José Gago

VOU PARAR DE SONHAR

Porque sou filho do sonho
sempre vivi a sonhar...
Toda a minha vida foi um sonho
vivido,sem acordar...!

Inventei estrelas
cantei trovas
colhi cardos e açucenas...
E num rio de ideias novas
diluí mágoas,e penas!

E tudo por um fim...
Que o sonho não se extinguisse
dentro de mim!

Porém, a minha luta foi em vão...
Porque mesmo sem querer
acabei por ceder
ás garras da desilusão!

Afinal, de que serve gritar
se as mentalidades estão surdas...?
De que serve erguer a voz
se a cobardia prevalece...?
De que serve ter pincéis e tinta
se não há papoilas para pintar...?
De que serve ser poeta
se ninguém canta canções de amor...?

Desisto! Vou parar de sonhar!

Sonhos, são somente sonhos
Castelos de fantasia...
Podem durar toda a vida
ou apenas só um dia...

José Gago

DESEJO

Eu queria adormecer
e acordar
num outro lugar...

Onde os homens se abraçassem
em vez de lutar...
Onde as aves cantassem
nas ramagens do luar...
E onde as crianças brincassem
com orquídias no olhar...!

Eu queria adormecer
e acordar
num outro lugar...

Onde os rios corressem
num leito de fraternidade...
Onde os ideais se fortalecessem
com os laços da lealdade...
E onde os sonhos florescessem
em canteiros de Liberdade...!

Eu queria adormecer
e acordar
num outro lugar...

Onde se respirasse tempo novo
sem nuvens, nem escuridão...
Onde os campos em renovo
parissem flores e pão...
E onde a voz sofrida do meu povo
fosse enfim, voz da razão!

José Gago

LEMBRANÇAS

É um facto,
que quando somos crianças
há coisas que acontecem
que depois pela vida fora
nunca mais se esquecem...

Por exemplo:
Por muitos anos que eu possa viver
nunca mais irei esquecer
o dia em que eu entrei para a escola...
Sapatinho no pé
batinha branca,
um caderno e um lápis, numa pequena sacola...

Oh! Lembro-me, como se tivesse sido ontem!

Rezingando, choramingando
levado pela mão de minha mãe
lá fui eu a caminho...
Vestido de anjinho...!

Naquele tempo
em que a miséria inundava as aldeias
sufocando as pessoas no seu abraço...
Todo o mundo passava fome
andava roto
e de pé descalço!

Por isso
quando eu cheguei e olhei
para aquele grupo de meninos e meninas
de aspecto miserável e olhar assustado
Lembro-me, de me ter sentido como que deslocado...
Talvez envergonhado...
Porque entre todos
eu era o único, que vinha calçado!

Senti que os meus futuros companheiros
me olhavam, como se eu fosse um previlegiado...
O que me deixava visivelmente atrapalhado!

Principalmente, porque isso não era verdade!
Eu era igual a eles todos
sofria a mesma realidade...
Quanto aos sapatos...
Eles eram apenas uma pequena vaidade dos meus pais...
Uma mariquice, a que eu não ligava
e que no fim, só me atrapalhava...!

Primeiro, porque eu não estava acostumado a essas peneiras...
E depois, porque eram um empecilho, para as minhas bricadeiras!

Eu gostava era de correr descalço...
Subir às arvores
chapinhar nas poças de água
dar pontapés nas bolas de trapo...
Ora, de sapatinho calçado
eu sentia-me, um pequeno animal acorrentado...!

Então, a solução
foi espontânea e natural
E não fez mal...

Quando à tardinha cheguei a casa
vinha descalço, sujo e molhado...
Na mão, trazia os sapatinhos
engraxadinhos
como se não tivessem sido estreados...!

Tudo se passou a sete de Outubro
de mil novecentos e cinquenta e um
dia igual a este
nunca mais houve nenhum!

José Gago




















A MINHA DOR DE VIVER

Cerro os meus olhos
e tento flutuar,
por sobre as águas
deste rio caudaloso
que me inunda o pensamento...
Mas sinto a vida a doer-me
nos fundões do desalento!

A vida dói-me
ao frio da noite incalma...
E porque a turbulência dos dias
me fazem doer a alma!

Dói-me o desencanto
e o sabor a frustração...
Dói-me o abraço hipócrita
mais o sorriso de ocasião...
E sinto um povo a doer-me
no lugar do coração!

Dói-me os ideais estagnados
com tanta coisa por fazer...
Dói-me os sonhos apagados,
impedidos de amanhecer...

Dói-me o ontem do medo
e o amanhã da incerteza...
Dói-me o riso da ostentação
ante o pranto da pobreza!

Dói-me a esperança a desistir
dói-me a vida a esmorecer...
Dói-me a força de resistir
à vontade de morrer!

José Gago

11/05/2012

EU PERTENÇO

Eu pertenço
a todos os que preservam, intactos
os alvores cristalinos, de antigas madrugadas...

Eu pertenço
a todos os que permanecem, desfigurados
pelas cicatrízes da memória...

Eu pertenço
a todas as memórias ensurdecidas
pelos ecos do Tarrafal...

Eu pertenço
a todos os rostos queimados
pelo vento gélido do exílio...

Eu pertenço
a todos os caminheiros do sonho
que pelo sonho é que foram...

Eu pertenço
às bocas amordaçadas, pelo jugo da repressão...
E às papoilas espezinhadas, nos campos de Baleizão!

José Gago

SOU O QUE SOU

Sou rio, sou barco e sou mar
favo de mel e colmeia...
Sou semente a germinar
sou eclipse lunar
romaria da aldeia...

Sou brisa fresca da serra
sou anarquia e sou lei...
Slogan que anda na berra
arado rompendo a terra
espiga de milho rei...

Sou boa nova, sou esperança
sou eco, antes do grito...
Sou tempestade e bonança
sou cansaço que não cansa
sou realidade e sou mito...

Sou vento que não acalma
soprando na noite fria...
Sou cântico que alegra a alma
sou ave que voa incalma
mas que canta até ser dia...!

José Gago

09/05/2012

OLHOS NOS OLHOS

Olhos nos olhos...
Frente a frente...
Eu gostaria de chamar-te incompetente!
Mentiroso, indecente!
Mas não posso fazê-lo
porque tu não tens olhos, infelizmente!

Tu és cego de nascença!
Não vês
nem nunca viste, nada à tua frente...
Muito embora estejas convencido
que vês mais e melhor que toda a gente!

Olhos nos olhos
gostava de dizer-te que és um quadrado...
Um burro, mal desenhado...
Um projecto de homem, reprovado!

Olhos nos olhos
eu queria enfrentar-te
humilhar-te...
Mas por fatalidade
tu não tens olhos, nem dignidade!

José Gago

O CUCO MALUCO

O cuco maluco
do relógio de sala...
Pia, rabia
canta, assobia
e nunca se cala...!

O cuco maluco
julga-se humorista...
Tem cliques e tiques
muitos tremeliques
mas é vigarista!

O cuco maluco
tem ar fanfarrão...
Mas ao cabo é nabo,
embandeira o rabo,
arma-se em pavão...

O cuco maluco
é falso e matreiro...
Mas um dia... Ai, ai!
Ele se distrai
e cai do poleiro...!

José Gago

O GRANDE CARNAVAL

Eles organizaram a festa
e convidaram todos os seus amigos
para o faustoso banquete...!

Houve comida a rodos,
guloseimas e champanhe para todos!

No arraial, tocaram a marcha triunfal...
Soltaram o fogo de artifício
e deram início ao grande carnaval...!

Mais tarde, todos reunidos
bem comidos, bem bebidos...
Bateram palmas
e os cargos foram destribuídos!

Nomearam-se, as chefias...
Estipularam-se, as regalias...
Instituíram-se, as mordomias...

E o carnaval prolongou-se,
eternizou-se nos dias!

Assistiu-se então...
Á ostentação, ao foguetório e à orgia!
Enquanto a conta crescia...
Crescia...
Crescia...!

E no fim e ao cabo
foi aí, que a porca torceu o rabo...!
Pois na hora de pagar
ninguém se quer responsabilizar!

Os mentores da festa...
Os que mamaram...
Os que se empanturraram...
Parecem até, que nem por cá andaram...!

O engraçado
é que o palco continua montado...
Á espera de outros banquetes
outros carnavais
outras festas iguais...!

Só que o Zé Povinho
já não aguenta pagar mais!

José Gago

MEU CANTAR DE LIBERDADE

Se por mera casualidade
quando a manhã acordasse...
Uma gaivota voasse
por sobre a minha cidade...

Talvez que ela levasse o meu cantar
para além do mar...!

Há! Se o meu cantar se ouvisse
onde não se ouve a razão...!
Talvez ele conseguisse
que uma janela se abrisse
clareando a escuridão!

E um cravo de amor florisse
em terras de servidão!

Se quando a manhã acordar
uma gaivota voar
por sobre a minha cidade...
Vou pedir-lhe p'ra levar
para terras de além - mar
meu cantar de Liberdade...!

José Gago

08/05/2012

SE EU PUDESSE SER O VENTO

Se eu pudesse ser o vento
fosse no mar ou na terra
eu varria o pensamento
dos que pensam só na guerra!

Este mundo feio, imundo,
da desgraça e desalento,
seria por certo outro mundo,
se eu pudesse ser o vento...

Tivesse eu a liberdade
e a força que o vento encerra
e reinaria a felicidade
fosse no mar ou na terra...

Aos que arquitectam horrores
roubar-lhes-ia o alento...
E aos cérebros malfeitores
eu varria o pensamento...

Sopraria meigo e terno
por sobre o campo e a serra
mas varria p'ró Inferno
os que pensam só na guerra...!

José Gago

MIRAGENS

Por entre as nuvens negras
que escurecem o firmamento dos meus ideais...
Irrompem, de quando em vez
pequenos fogachos de alento,
que vêm arejar-me o pensamento!

São breves lampejos de claridade
tão radiosa, como enganosa...
Miragens
num sonho cor de rosa...

Eu sei que as miragens, não passam disso mesmo...
Miragens!
Fantasias!
Utopias!
Que nos iludem todos os dias...

Mas porque não acreditar numa miragem colorida
que nos traga a ilusão de nova vida...?

Afinal, ninguém me pode garantir que o verde
será mesmo a cor da esperança...!

José Gago

S.O.S.

Na corrente incontrolável,
deste rio sujo e bruto...
Vejo o meu país a afundar-se
minuto a minuto!
Sem que eu consiga perceber
se ninguém vê
ou se ninguém quer ver...!

Será possível, ninguém reparar na tristeza dos campos...?
Na agonia das flores...?

Será possível, ninguém ver o desmoronar das serras...?
A decadência dos rios...?

Será possível, que ninguém oiça o pranto das aves...?
O apelo das giestas...?

À derrocada da última esperança,
seguir-se-á a partida da ultima andorinha...
Abrindo o espaço
à catástrofe que se adivinha...!

S.O.S.
Que venham os Socorristas
os Sapadores...
Que venham os Artistas
os Doutores...

Mas venham depressa
e salvem os últimos valores!

José Gago

BARQUITO DE SONHO

De madrugada
assim que o horizonte clarear
vou fazer-me ao mar
no meu barquito de sonho...

Aproveitando a maré alta da esperança
vou passar a barra do desânimo
e perder-me no azul infinito
do meu mundo navegante...

Não levo bússula, nem mapas
nem cartas de orientação
levo apenas a ancora da coragem
e as amarras da ilusão...

Não me assustam o mar medonho,
vendavais, ou sol a pino...
No meu barquito de sonho
hei-de encontrar o cais, do meu destino!

José Gago

07/05/2012

O ELO MAIS FRACO

Quando a incompetência nos toureia
nos humilha, nos chateia
e p'rá miséria nos arrasta...
Calar mais não vale a pena
se o povo é quem mais ordena
eu sou povo, e digo basta!

Já não posso
já não quero
já não dá...
Ver o meu povo ao Deus dará!

Já não há perguntas...
Já não há respostas...
O jogo está inquinado!
Viciado!

Enquanto uns enchem o saco
o povo não tem pataco...
E é cada vez mais
o elo mais fraco!

José Gago

PASSEAR COM O TEMPO

De vez em quando
sem me aperceber bem do que faço...
Envolvo o tempo num abraço
e saímos os dois por aí, de braço dado
a recordar o passado...

Então o tempo, num assomo de garotice
leva-me quase sempre ao fundo da memória
onde estão guardados
os restos da minha meninice...!

É cruel o tempo!
Até parece que faz isso para me castigar...
Mas eu gosto de lá ir
umas vezes para rir
outras vezes para chorar...!

É um pouco estranha, esta minha relação com o tempo
há até quem não entenda muito bem, a nossa cumplicidade...
Mas que fazer...?
Somos amigos - E não se pode trair uma boa amizade!

Mas também há momentos
em que o tempo acaba por se chatear...
Chama-me velho!
Chama-me,chato
E manda-me passear...!

José Gago

ABRIL

Chegou esfuziante!
Triunfante!
E trazia bandeiras desfraldadas
no seu semblante...!

Acordou as vielas
abriu as janelas
e enfeitou as ruas,
com o brilho intenso das estrelas!

Chamaram-lhe louco!
Escondeu-se um pouco...

Foi perseguido
denegrido
mal entendido...
Mas nunca foi, nem nunca será vencido!

Abril é rio que corre
é marcha triunfal...
É um cravo que não morre
e perfuma Portugal...!

José Gago

06/05/2012

UMA RÉSTIA DE SOL

A ti, meu amigo!
Meu camarada, meu irmão!
A ti, velho guerreiro
companheiro da fisga e do pião...

Como vai distante, meu amigo
o nosso tempo dos trigais...
Dos campos floridos
e dos sonhos coloridos
que não vivemos nunca mais!

Como vão longe os nossos jogos e corridas
as lutas, as guerras fracticídas...
Os duelos travados a dois
esquecidos, logo depois...
Incrível, meu amigo!
Como o tempo,desbaratou o nosso tempo...!

Como cavaleiros das trevas,
percorremos uma a uma,
as veredas emaranhadas da nossa ilusão...!
Pintámos as estrelas com as cores vivas da irreverência
E descobrimos tesouros
em cada canto da nossa inconsciência...!

Até que aos poucos
fomos perdendo o rasto às nossas emoções!
Eliminámos os piratas...
Mandámos à fava os espiões...
E findámos para sempre,
essa luta permanente, entre policias e ladrões...!
E foi assim,que sem dar-mos por isso
nos tornámos uns calmeirões!

Veio a tropa...
Veio a guerra do Ultramar...
Vieram os caminhos tortuosos da vida...
E só agora no Outono, nos voltámos a encontrar!

Só que agora, estamos velhos meu amigo!
Os nossos olhos, já não têm o mesmo brilho
que outrora os iluminou...
E nem eu, nem tu
conseguimos esconder as marcas do chicote
com que o tempo nos castigou!

Aqui; sentados à esquina da tristeza
tentamos aquecer o coração
na derradeira réstia de sol que a vida nos oferece...
Ao mesmo tempo que desfiamos, velhas histórias
dum tempo que não se esquece...!

Mas recordar sem chorar
é o lema que nos deve nortear...
Vamos sim, pôr um sorriso alegre na lapela
e abrir no coração uma janela
para a réstia do sol poder entrar...!

José Gago

04/05/2012

DEBAIXO DA PONTE

Eu sei que há quem me condene
quem me aponte...
Por esta minha maneira de ser
e gostar de viver, debaixo da ponte!

E porquê, debaixo da ponte...?

Porque debaixo desse tecto improvável,
eu sinto-me um cidadão neutral...
Uma vez que a ponte, separa dois mundos diferentes
um que é fictício, e outro que é real...

Daí que eu esteja confuso,
suspenso...
Porque ainda não consegui descobrir,
a qual dos dois mundos é que eu pertenço...!

Olhando para um e para outro,
os dois mundos até me parecem iguais...
Num, eu vejo realidades que parecem fictícias
no outro, vejo comportamentos e acontecimentos fictícios,
que até parecem reais!

Nesta incerteza
e até que a verdade desponte...
O melhor será esquecer
e continuar a viver, debaixo da ponte...!

José Gago

02/05/2012

ELES ANDAM AÍ...

Atenção minha gente!
É urgente ficar alerta
porque a guerra está aberta...!
Eles andam aí...

Vieram no bico da cegonha
sem vergonha, nem respeito
e roubam tudo a eito!
Eles andam aí...

Bem vestidos, bem parecidos
importantes, bem falantes
delicados...
Até parecem gente decente
mas no fundo são, somente
gatunos disfarçados!

Eles andam aí
para mal dos nossos pecados!

José Gago

DOCUMENTO SEM TÍTULO

Eu sou um documento sem titulo
que existe
mas não existe...

Sou a mentira
que não é mentira...

Sou a verdade
que não é verdade...

Sou um papel sem letras
sem cor
sem valor
nem qualquer utilidade!

Sou uma licença inventada
sirvo para tudo
mas não sirvo para nada!

Sou nota de crédito
sem crédito...
Sou um cheque sem provisão!

Sou um passe caducado
bilhete usado...
Espécie de talão
a que ninguém passa cartão!

José Gago

NASCI TORTO

Sempre que dou comigo a pensar
nas mil e uma coisas, que eu poderia ter feito
mas não fiz...
Sinto-me, um zero à esquerda
uma árvore sem raiz!

E o que mais me incomoda
é que muitas dessas coisas, teriam sido para mim
bem fácies de concretizar...
Bastaria para isso, que eu tivesse feitio para bajular
para rastejar
e tudo se poderia arranjar...!

Mas pronto!
Não aconteceu, porque não tinha de acontecer...
E agora, é tarde para me arrepender!

Basicamente, porque que nasci torto
e torto hei-de morrer...!

José Gago

EU VI

Eu vi!
Os barcos serem desmantelados
o mar ficar triste
e os pescadores, sobressaltados!

Eu vi!
Destruirem as vinhas e os pomares
arrancarem as oliveiras
e desactivarem os lagares!

Eu vi!
Os campos de cultivo ficarem incultos
abandonados...
por conta de alguns cérebros, iluminados!

E a razão, para tanta destruíção
Seria a nossa integração,na UNIÃO...
E então...
Choveram os subsídios...
Semeou-se o oportunismo...
Estendeu-se o alcatrão...!

Hoje, sem pão, nem chão
nem barcos amarados...
Temos um país à deriva, de olhos vendados
pés e mãos amarrados
e sonhos esfrangalhados...!

Porque, os tais cérebros iluminados,
afinal, estavam errados!

José Gago

01/05/2012

A COR DA GENTE

Se há coisas a que eu não dou valor
ou, às quais fico indiferente...
Uma delas, será a cor
que me atribuem, politicamente!

Para mim, o ser vermelho
rosa, laranja, ou cor diferente
nada tem a ver, com a cor da gente...

É claro, que os ideais
não são todos iguais...
Mas não impedem amizades
verdadeiras e leais!

Um bom amigo, pode ter politicamente
uma cor diferente...

Mas a bandeira da amizade
terá sempre a cor da Liberdade...!

José Gago

PANÇA CHEIA

Vejo-te no dia a dia,
cada dia mais distante
mais importante
vaidoso e arrogante...

Se porventura, foste alguma vez
a aragem natural, prenunciadora da mudança...
Hoje, não és mais do que um frio glacial
que gela toda a esperança!

Insensível, indiferente
como chefe da alcateia...
Empurras para a frente,
a tua pança bem cheia...
Protejendo os desígnos
da corja que te rodeia!

Em troca, esqueces
e escarneces
os que se deitam sem ceia...!

José Gago

MEDIDAS

Oiço falar o director
e o inspector...
Fala depois o administrador
mais o assessor...
E todos eles dizem, sim senhor!
É preciso tomar medidas...

Escuto o ministro
e o presidente...
O consultor e o assistente
e a solução não é diferente!
É preciso tomar medidas...

Conclusão:
É preciso tomar medidas...!

Mas que medidas...?

Medidas que defendam quem ganha abaixo da medida...?
Medidas que protejam os que sofrem acima da medida...?
Claro que não!

As medidas de que eles falam
são medidas a favor dos que ganham sem medida...
Dos que especulam sem medida...
Dos que roubam sem medida...
Dos que acumulam lucros sem medida!

Isto é...
É preciso tomar medidas, à medida
da cambada, enriquecida...
Quanto aos pobres, eles que cuidem da sua vida...!

José Gago

A RATOEIRA

Eu sentei-me
ela sentou-se
e a conversa desenrolou-se...

E vai daí, ela disse...
Que sendo eu um homem super-interessante...
A noite seria escaldante!

Que no momento preciso,
ela me levaria ao paraíso...!

Que sem complexos, nem pudores
ela me faria ver estrelas de todas as cores...!

Ela disse, eu acreditei
e para minha casa a levei...
Depois...
Bem, depois nem eu sei!

Quando acordei da bebedeira...
não tinha anéis, nem pulseira,
não tinha relógio, nem carteira...

Tinha caído na ratoeira...!

José Gago

SE EU MANDASSE...

É bem verdade, que esta coisa de mandar
nunca será tão fácil,como se possa imaginar...
Mas porra!
Quem manda, tem que saber mandar...
Porque senão, só consegue chatear!

Mas... Se eu mandasse...
Isto mudava a face!

Se eu mandasse...
Talvez a justiça funcionasse
o crime não alastrasse
e a corrupção não se instalasse!

Se eu mandasse...
Talvez a pobreza se erradicasse
a desigualdade não imperasse
e o ensino não se degradasse!

Se eu mandasse...
Talvez a democracia ressuscitasse
o capital não dominasse
e a vida de todos, melhorasse!

Se eu mandasse...
Talvez a "Troika" nos deixasse,
a esperança regressasse
e o povo por fim, sonhasse...!

José Gago

PERDOA MÃE

Perdoa mãe!
Por eu nunca ter dado ouvidos
às tuas preocupações, aos teus pedidos...

Nesse tempo, tu bem me dizias
e insistias
para que eu estudasse e me esforçasse em aprender
para que um dia mais tarde
não me viesse a arrepender...!

Mas eu nunca quis saber!
Cego pelos delírios da meninice...
A escola para mim,
era simplesmente, uma chatice!

Só hoje, minha mãe
de tropeção em tropeção...
É que eu entendo
o quanto tu tinhas razão...

Peço-te perdão minha mãe
por eu não ser hoje, aquilo que tu tanto gostarias...
Mas os teus conselhos
ecoam em mim, todos os dias!

José Gago

ELES QUEREM MAIS


Eles, há muito que estavam á espera...
E quando chegaram
rejeitaram os cravos, e espezinharam as papoilas!
Mais tarde, mutilaram as rosas...
E após o ultimo malmequer
extinguiram, a Primavera!

Mas eles não estavam satisfeitos...
Eles queriam mais!
Eles, querem sempre mais!
Por isso, escureceram o sol...
Esconderam as estrelas...
E apagaram os sonhos...

Mas eles não estavam satisfeitos...
Eles queriam mais!
Eles, querem sempre mais!
E, então...
Eles decidiram secar os rios...
Assassinar as aves...
Destruir as serras...
E incendiar o mar...!

Quando eles estiverem satisfeitos
o mundo pode acabar!

José Gago

OS CÃES LADRAM

Que me importa a mim
que os cães ladrem quando eu passo
se eu passo, sem lhes ligar...?
Que me importam os latidos
dos "vira latas" enraivecidos
que ladram, só por ladrar...?

Eu bem os oiço e vejo
disfarçados...
Ladrando por detrás dos valados
tímidos, amedrontados...

Mas que ladrem!
Que ladrem os rafeiros
os perdigueiros e os caniches eriçados...
Os corpolentos, os pulguentos
os dentolas e os desdentados...

Que ladrem os neutros
e os cães de raça...
Porque quanto mais eles ladram
melhor a caravana passa...!

José Gago